Notícia  /  17.01.2024

Crónica de cinco dias no mundo dos deuses

O texto que se segue conta na primeira pessoa a experiência da visita a Atenas e Olímpia, organizada pela Academia Olímpica de Portugal em outubro de 2023. Crónica de cinco dias no berço dos Jogos Olímpicos – os antigos, em Olímpia, e os modernos, em Atenas – por uma das integrantes do grupo da viagem.


Primeiro dia, 4 de outubro

Emoção, camaradagem, unforgetable, partilha, espetáculo, knowledge e gran recuerdo (versão casal), são as expressões que marcam a viagem da comitiva da Academia Olímpica de Portugal à Grécia, no início do passado mês de outubro.

Para uns foi a estreia por completo no grande tema do olimpismo, enquanto para outros foi o voltar ao local onde foram felizes.

No terminal 2 do aeroporto de Lisboa, as primeiras impressões serviram para conhecer o grupo, lembrar pontos essenciais de visita e garantir que toda a documentação estava tratada e orientada.

Controlo de segurança efetuado, malas no avião e rabos nos bancos, foi tempo de seguir para Barcelona, com uma paragem para esticar as pernas e comer uma sandes antes de rumar a Atenas. E se na primeira viagem a conversa foi menor, no segundo voo, os assuntos em comum partilham e dominaram o tempo.

Em Atenas, o telemóvel ganhou vida e começou a registar os letreiros, as imagens afixadas, e, mesmo com o tempo fresco, a temperatura de estar mais próximo do destino fez aumentar o calor.

A primeira impressão foi mista: por um lado, um “mundo” novo, cheio de novidade, mas, por outro, uma triste realidade ligada a um país fortemente atingido pela troika. Muitas paredes grafitadas, um povo pobre e (demasiado) dependente.

O hotel, Delphi Art Hotel, no meio de uma avenida agitada, com um estilo característico neoclássico, de 1930, mereceu uma visita rápida, porque era tempo de procurar um local para jantar.

A Praça Omónia foi o destino, para uma salada típica: salada Caesar, salada de atum ou uma Pita Souvlaki. E se as saladas gregas são uma maravilha, após o atravessar do Mediterrâneo, imaginem as cornucópias na montra de uma pastelaria. Mas, para não gastar os créditos todos num dia, a tentação ficou para depois.

O dia, já de madrugada, terminou com o planeamento do dia seguinte, entre mapas de metro, monumentos e os melhores spots em Atenas.

 

Segundo dia, 5 de outubro


Feriado em Portugal, dia de passeio em Atenas.

Um bom pequeno-almoço bem cedo, pela manhã, e a entrada no metro. Atenas tem uma vida de noite e outra de dia. O metro, com um fiel amigo do mapa, é rápido, prático, limpo, mas marcado pelos graffiti.

Destino: complexo desportivo de Atenas-2004, para visitar o Museu Olímpico.

Como bons turistas, de mochila às costas e telefone na mão, houve tempo para registar o momento, de frente para o sol, de costas para o sol, com vento e sem vento e só não se fez o pino porque os músculos já não dão uma ajuda.

A visita foi gentilmente acompanhada por uma responsável do museu, que nos revelou muitos pormenores e satisfez a curiosidade sobre muitos dos factos até agora só conhecidos dos livros.

No final da visita, houve tempo para a foto de grupo e para assinar o livro de honra do museu. Depois, a viagem prosseguiu até Monastiraki, para encontrar o restaurante recomendado para o almoço.

Mas porque a barriga manda mais do que o cérebro, à saída do metro, o Fernando e a Edite não resistiram e atacaram a banca de figos.

Mapa para aqui, google maps para ali e acabámos por passar várias vezes em frente ao restaurante recomendado, encerrado para folga.

Restaurantes são coisas que não faltam no centro turístico de Atenas e eis-nos sentados para saborear um misto de diferentes tipos de carne, acompanhados de pão, batatas e uns extras. No final, a conta chega com taxa de mesa. “Normal”, dizem na Grécia! E nem a cordialidade negocial da Ana Leite conseguiu convencer o proprietário do restaurante de que em Portugal “não há taxa de mesa”.

Se as cornucópias conquistaram os olhos no primeiro dia, no segundo foi a montra de gelados. De todas as cores, sabores e feitios. O gelado soube uma maravilha e deu para 1 km de caminhada. Mais olhos que barriga, gelado para a viagem inteira, mas a cornucópia não saía da cabeça.

Uma viagem destas, em grupo, é sempre boa com histórias para contar e esta não foi exceção. Navegámos pelas ruas de comércio, seguimos a direção errada do local para onde queríamos ir, vimos ímanes, camisolas de futebol, olhos do mau-olhado e gatos de todas as formas e feitios. O passeio foi maior do que esperado e demos a volta ao quarteirão. Com calor, parámos algumas vezes no caminho até à praça Sintagma, para ver o render da guarda do Parlamento.

Fernando, Edite e Teresa seguiram de táxi até ao Estádio Panatenaico, enquanto o resto do grupo prosseguiu o caminho a pé.

A chegada ao estádio é um momento de cortar a respiração. Quem teve coragem e pernas, cruzou o monumento de uma ponta a outra, subiu as bancadas e tirou fotos de cima, de lado, no lugar do imperador, de frente para os anéis olímpicos e até com os anéis ao fundo.

Os cartões de telemóveis ficaram bem preenchidos com esta volta e o coração bem mais cheio.

O caminho de regresso fez-se por Plaka e começou a “tortuosa” entrada e saída em lojas de souvenirs. Nada supera a Little Poems, com uma sala dedicada a Atenas-2004. Imagino que ainda há quem esteja a pensar regressar a Atenas só para mergulhar naquela “viagem no tempo”.

As saladas do dia anterior ficaram na memória e o destino ao jantar foi idêntico, novamente para saladas.

No regresso ao hotel, confirmámos que as cornucópias não estavam na montra, mas as baklavas sim. Filipe, Afonso e Marina não resistiram.

 

Terceiro dia, 6 de outubro


Conhecem o provérbio “Deitar tarde e cedo erguer, a Acrópole vão ver”?

Traduz um pouco o terceiro dia em Atenas. A saída do hotel foi ainda mais cedo, diretos à Acrópole. Bilhetes comprados às 9 horas, entrada às 11 horas e longas filas de espera. Como ocupar o tempo? Como o típico português, com um belo café. Bem… café na Grécia não é Delta e, por isso, entre café com espuma, café com borra ou café gelado, houve de tudo.

Existiu ainda uma missão: recuperar o livro perdido no dia anterior numa loja de souvenirs. O tempo de espera para a acrópole ajudou, bem como a simpática da lojista, e lá se recuperou a obra.

Próxima estafa? A Acrópole… e que estafa! Abençoadas sombras, bonés com o logótipo Atenas-2004 e até um sombrero que cabia milagrosamente na mochila de um membro do grupo cauteloso.

A chegada ao topo é dura, com acesso complicado, apinhada de gente e com possibilidade para trocar dois dedos de conversa com umas jovens turistas portuguesas, da Figueira da Foz, que também visitavam a capital grega.

O topo é incrível, com vista ímpar sobre Atenas e não só. Uma dimensão gigante, tal como a Acrópole. Uma sensação onde respirar parece que perturba. Pode dizer-se que é gigante, enorme, monstruosa, mas ninguém sente essa sensação como quando se está lá em cima.

A mesma multidão da subida regista-se na descida e imaginem só: também aqui se encontram pessoas de Pombal.

Leiam bem o que vos digo: há sempre um português em qualquer parte do mundo e há sempre um pombalense em todos os locais do mundo para onde vão. Atenas não foi exceção.

Querem outros exemplos: há 23 anos, quando seis portugueses foram enterrados em cimento no Brasil, eram de Pombal; o lusodescendente que ficou ferido num ataque este ano num parque infantil em França era de Pombal; um dos sobreviventes do tsunami na Tailândia em 2004 era de Pombal; … podia continuar.

Era tempo de regressar, ainda houve tempo para nova incursão na rua dos souvenirs, em busca da loja com artigos de Atenas-2004. Filipe, Ana e Paulo andaram, rua acima, rua abaixo, atrás da loja que teimava em não aparecer. Foi o telemóvel que esclareceu: era a Little Poems, que àquela hora permanecia de grades fechadas. A desilusão instalou-se no rosto deles.

O almoço aconteceu numa nova zona de esplanadas e houve ainda tempo para ensinar como se tiram fotografias com a palma da mão. Uma “corrida” rápida até ao hotel, a olhar para o relógio, e “pegar” no casal Martins, que aproveitou a manhã para ficar a dormir até mais tarde e visitar a cidade em aerobus, com guia em português. Contaram que “valeu mesmo a pena”. Que bom!

A melhor parte da viagem estava para chegar. E não, não me estou a referir às quatro horas de viagem de carro até Olímpia, com um condutor que ligava pouco aos limites de velocidade e levava o nosso coração ao limite perante uma cancela de portagem.

A Ana ia lá na frente, a travar no chão da carrinha. Já a Marina e a Teresa falaram durante toda a santa viagem. Nem a garganta se lhes secou.

O percurso contou com uma paragem no canal de Corinto para a foto da praxe e esticar as pernas, antes da última etapa até Olímpia, com chegada à Academia (AOI) em contramão.

Instalados nos respetivos quartos, houve tempo para conhecer o nome e percurso dos atletas que davam nome aos aposentos, um jantar maravilhoso e acolhedor e uma caminhada até à vila, para beber uma Mythos.

O Eduardo, aluno de mestrado em Estudos Olímpicos, natural de Barcelos, era o único português na AOI e acolheu-nos lindamente, como todos. Bastante disponível, alinhou no nosso desafio de acordar cedo e ir ver o nascer do sol no monte Cronos, na manhã seguinte.

Claro que não há saída sem souvenirs e lá voltaram eles carregados de recuerdos e com muitas paragens estratégicas para pit-stop. Chegada à AOI depois da meia-noite e encontro marcado para poucas horas depois, para o ambicionado nascer do sol.

Resumo do dia: cerca de 19 mil passos, 18 km percorridos.

 

Quarto dia, 7 de outubro


Sabem aquela cara de quem abre a porta, saído da cama, porque tocaram à campainha para uma urgência que afinal não era assim tão urgente? Foi assim que eles se aventuraram até ao monte Cronos, com poucas horas de sono, algumas dores nas pernas e o desejo de ver o sol romper entre as montanhas, às 7h42 certinhas.

35 minutos para cada lado e estava feito o primeiro passeio do dia. Um momento, sem dúvida, incrível e que ficará na memória de todos os que “vestiram” o fato de atletas olímpicos.

O regresso foi em modo sprint para o pequeno-almoço, antes de nova saída para o sítio arqueológico com toda a equipa.

A visita, com guia em inglês, foi ajustada aos elementos do grupo e permitiu conhecer os principais spots do sítio arqueológico e satisfazer muitas das curiosidades, até agora só conhecidas em livro.

A manhã terminou com a visita ao Museu Arqueológico de Olímpia, um espólio riquíssimo da cultura grega e da história mundial.

Segundo desafio do dia: regresso à Academia, perante um calor intenso, em plena hora de almoço.

Ao início da tarde assistimos a um vídeo sobre a AOI, onde o Paulo aparecia por diversas vezes, com imagens dos momentos que marcaram a primeira visita que fez há vários anos. Os momentos foram marcados com um “olha eu ali” ou um sorriso rasgado, inevitável de quem já sentiu Olímpia na pele. Seguiu-se uma visita ao arquivo da Academia sobre os Jogos de Atenas-2004 e a entrega de alguma documentação, o que encheu os nossos corações (mais um bocadinho).

O período que se seguiu podia ter sido usado para descansar, mas foi aproveitado para esticar as pernas ao ar livre, aliviar os pés e dar à língua, como tão bem fizeram ao longo destes dias.

Às 16 horas, novo desafio de caminhada para o Museu dos Antigos Jogos Olímpicos, direito a uma última Mythos, ainda uns souvenirs e um regresso pausado (finalmente) à Academia.

O jantar foi talvez a refeição mais relaxada de toda a viagem, certos de que as últimas horas em terras de Nikê estavam a terminar.

Deu ainda para trocar cromos, isto é, muitas das fotografias registadas nos últimos dias. Agora para ti, depois para ti, espera ainda tenho aqui outra, por e-mail, messenger ou whatsapp. Uma autêntica linha de montagem.

Contagem do dia: 28.853 passos, 21,6 km.

 

Quinto dia, 8 de outubro


Para os mais distantes, entre o momento de acordar e chegar a casa, foram qualquer coisa como 18 horas de viagem. Acordar às 7 horas com a versão “Canção do mar” em chinês a soar das colunas, um efeito surpresa a que a maior parte não tinha assistido no dia anterior, porque nessa altura estavam no cimo do monte à espera do sol.

O pequeno-almoço na AOI terminou em corrida, afinal era preciso manter o espírito desportivo da viagem, colocar as malas no carro e partilhar mais quatro horas de viagem até ao aeroporto.

Check-in cumprido, foi tempo de descansar e compor o estômago até à hora de embarque para Barcelona.

Com algum atraso e uma vontade grande de regressar a casa, a que se juntou alguma confusão a ler o écran das partidas, fez-se um sprint desnecessário, para uma porta de embarque que ainda estava longe de abrir. Já se sabe, o espírito de atletas nunca os larga…

A viagem para Portugal aconteceu dentro do horário previsto, sem sobressaltos. Despedidas ao grupo e diferentes rumos para casa: uns de carro, outros de táxi, outros de metro, comboio e Expresso.

Hora de chegada: 1h00, o telemóvel cheio de imagens e o coração a rebentar de conhecimento.

 

Marina Guerra

8 de dezembro de 2023

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